CANTA CHICO
Ellza Souza (*)
O cenário a meia luz do Largo São
Sebastião e a abafada noite de verão fizeram com que o público, ansioso,
manifestasse sua pressa em ouvir o artista do projeto Tacacá na Bossa do dia 29
de agosto, com o apoio da banca da Gisela nas pessoas dos dedicados Joaquim e
sua esposa e da Secretaria de Cultura do Estado. Mesmo depois que Chico da
Silva apareceu no palco, todo engomado e de branco, num requinte merecedor
daquela apresentação tão esperada, os fãs continuaram pedindo fervorosamente
para o artista cantar, cantar e cantar. Apesar do atraso devido a problemas
técnicos ninguém arredou pé de seus lugares.
O cantor
e compositor é parintinense e autor de músicas que até Deus duvida que sejam
suas, pela extensa quantidade de obras simplesmente fascinantes e empolgantes.
Confesso que fui à praça sem muita empolgação pois o samba não é lá minha
predileção de música. Mas o que assisti no Tacacá na Bossa daquela noite foi um
recital de poesias, de composições musicais onde as palavras são bem colocadas
e enfeitam a melodia por quem sabe fazer isso muito bem. Nos intervalos do seu
canto Chico da Silva relatou primorosas histórias de inspiração e parcerias que
enriqueceram sua carreira e o show.
Ali mesmo
debaixo daqueles benjamizeiros, em pé pois as cadeiras não foram suficientes
para a grande platéia que ovacionava o artista, e ainda sofrendo um ataque de
formigas que me fizeram correr para lugar seguro, comecei a dar os primeiros
passos no ritmo do samba de Chico da Silva. A lindeza de poemas que saíam de
sua boca deixaram a minha bem aberta. A vontade de prestar atenção nas belas
palavras, na música marcada e dolente, no som dos instrumentos da banda, era
grande mas precisava dar uns passos e, mesmo sem saber dançar, fui levada pelo
ritmo impressionante daquelas canções.
Além de
sambas como “Prá Chatear”, “Samba também é vida”, “Pandeiro é meu Nome”,
“Diário de um Boêmio”, alguns cantados por Alcione, Chico fez também toadas dos
bois Caprichoso e Garantido. Ouvi a palavra “azulescente” quando o cantor se
referiu à sua infância na encantada ilha de Parintins onde nasceu. Mas apesar
de ter sido um dia azulescente Chico se bandeou para o contrário e avermelhou
explodindo com Vermelho na voz de David Assayag e Fafá de Belém.
Com 35
anos de carreira e algumas paradas para reforçar o gogó e a mente, Chico da
Silva é hoje a nossa “waikiru” maior, em saterê maué, estrela. Pela
persistência, pela ousadia, pela simplicidade, pela poesia, pela competência,
pela melodia, pelo brilho único. Nessa noite no Largo todos cantaram
vaidosamente o hino do Chico, “Amazonas”, para muito além do
infinito.
(*) É
escritora, jornalista e articulista do NCPAM/UFAM.