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segunda-feira, 29 de abril de 2013
PARTIDOS PARA DAR E VENDER
Sempre que se mexe com os partidos tudo sai do lugar, a começar dos
interesses e planos forjados nas instâncias políticas e governamentais. Como há
um calendário eleitoral e o governo se atirou de corpo e alma na batalha pela
aprovação do projeto, o ambiente político ficou nervoso.
A relação entre qualidade da
representação, número de partidos e mecanismos de criação de siglas merece ser
sempre bem analisada. As distintas situações nacionais concretas ensejam
múltiplos sistemas partidários, seja no que diz respeito às suas regras, seja
quanto à maior ou menor facilidade para que se criem partidos.
Não há de antemão
um número ótimo de partidos nem critérios pétreos que fundamentem uma regra
para sua multiplicação. A questão de saber quantos partidos suporta uma boa
representação democrática é retórica: não dá para ser respondida. Democracias
de boa qualidade sobrevivem mesmo que tenham sistemas partidários fragmentados,
basta que algumas grandes forças partidárias organizem a competição política.
Partidos surgem conforme cálculos
e desejos que não estão em manuais. A busca de regulação do processo reflete o
desejo das cúpulas de impedir que a representação se despedace e atrapalhe a
governabilidade. Em especial hoje, época de muitas postulações de identidade e
múltiplas agendas, o pluralismo não cabe numa divisão simples entre direita,
centro e esquerda, por exemplo. Impor camisas de força não funciona e pode até
afastar do jogo político as minorias não partidarizadas e sem chances de criar
seus partidos.
Isso também ocorre nos países
onde as tradições históricas, a cultura política e o processo de organização do
Estado estabeleceram regimes fortemente polarizados entre duas forças gigantes,
como nos EUA (democratas x republicanos) e na Inglaterra (conservadores x
trabalhistas). Neles, ou as minorias se compõem e se diluem nos grandes
partidos ou vegetam na margem do sistema, dele se excluindo. Seja como for,
sistemas partidários desse tipo são produtos da realidade, não o resultado de imposições
legais.
Exceção feita aos períodos
ditatoriais, o Brasil sempre foi "multipartidário", sempre conviveu
com a proliferação de legendas e com a dança dos parlamentares entre elas.
Criar partidos tem sido uma preferência nacional, um traço de nossa vida
política. Seja para acomodar novos interesses, resolver pendências ou dar vazão
a apetites eleitorais.
O problema agravou-se a partir
dos anos 1980, quando a sociedade ficou mais complexa e se desfez a unidade
democrática contra a ditadura. Dezenas de siglas se esparramaram então pela
vida política nacional, a maioria delas com existência fugaz e perfunctória. O
mecanismo de criação de partidos ficou desregulado. Tornou-se mais fácil fundar
uma legenda do que abrir uma conta bancária. Migrações sem critério entre os
partidos tornaram-se usuais.
Fatores tópicos ajudaram a que
isso ocorresse. Os partidos principais, PMDB, PT, PSDB, estruturadores do
sistema, foram perdendo magnetismo e condicionando sua capacidade de atração ao
uso dos recursos de poder, ampliados à medida que conquistavam governos.
Desfizeram-se as identidades tradicionais e o surgimento de novas identidades
fez aumentar o empenho por novos partidos. A dinâmica democrática geral foi-se
mostrando mais forte do que os partidos e estes, ao chegarem aos governos, mal
conseguem distinguir-se uns dos outros, fato que passou a ser percebido pela
opinião pública, contagiada ela própria por uma visão antipolítica que vitima
antes de tudo os partidos e os parlamentares. Abandonados pelos cidadãos, os
partidos foram se concentrando em seus próprios negócios internos,
burocratizando-se. Parlamentares mais coerentes passaram a cogitar da criação
de legendas mais "autênticas" para compensar a indigência partidária
prevalecente. Ao mesmo tempo, políticos fisiológicos, sem espaço nos partidos
existentes, sentiram-se incentivados a criar legendas à sua imagem e semelhança
para assim construírem bases com que tornar viáveis suas pretensões eleitorais.
Por fim, a legislação eleitoral, ao vetar as candidaturas independentes,
empurrou os políticos para a multiplicação artificial de legendas. Com a
valorização do tempo de propaganda na TV e sua distribuição conforme a votação obtida,
o círculo fechou-se.
A discussão atual tem um quê de
bizarrice. Caso um parlamentar abandone seu partido por outro, leva ou não
consigo a representatividade obtida nas urnas? Seus votos lhe pertencem ou são
do partido? A questão é bizarra, mas faz sentido: afeta diretamente os jogos de
poder. Segundo as regras vigentes (que não autorizam os partidos a apresentar
listas fechadas aos eleitores), o mais lógico é que os votos fiquem com os
parlamentares que os receberam. Mas os partidos os patrocinaram e podem arguir
que também são tão donos dos votos.
O projeto aprovado na Câmara não
proíbe a criação de partidos. Seus promotores alegaram que desejam impedir que
se repitam artimanhas como a da criação do PSD, que nasceu rico graças ao
"roubo" de deputados de várias siglas. Mas escolheram um péssimo
momento para fazê-lo. Deram a impressão de querer atrapalhar as propostas ora
em gestação, mexendo nas regras com o jogo em curso. Ninguém foi excluído, mas
a medida prejudica os que desejam crescer mediante a captura de descontentes e
reduz o potencial imediato de qualquer sigla que venha a surgir. Tem cara de
armação, mesmo que em médio e longo prazos sobrevivam todos os partidos, e mais
alguns.
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