Mário Souza* - Foto: José Farias
O resultado
foi o surgimento de intelectuais e escritores nativos da região, que
contribuíram para formar um pensamento e pela primeira vez interpretaram aquela
realidade (amazônica) unindo a vivência e a erudição. A base educacional
montada neste final do século XIX, legou ao Brasil escritores como Inglês de
Sousa e José Veríssimo.
É no marasmo do século XIX que a cultura será escamoteada ao povo, transformada
em ritual ridículo e esvaziada de sentido. O poeta Gonçalves Dias, enviado ao
Norte, 1853 pelo Império como membro da Comissão Científica de Exploração,
visitou diversas escolas e incluiu em seu relatório de viagem em capítulo sobre
a educação no Amazonas (Rio Negro e Solimões), registrou a pouca frequência às
aulas e o fenômeno da rejeição da língua portuguesa por uma população de fala
nheengatu, usada “em casa e nas ruas e em toda parte”. Os poucos que tinham
recursos para frequentar uma escola ou uma universidade no sul do país ou no
exterior, voltavam tão desligados da vida pacata que não conseguiam mais
compreender sua terra natal.
Foi este relatório que desencadeou um programa
educacional sem precedentes para o norte do império, provavelmente o único
programa de grande extensão e investimento realizado pelo regime de Pedro II na
área educacional. O resultado foi o surgimento de intelectuais e escritores
nativos da região, que contribuíram para formar um pensamento e pela primeira
vez interpretaram aquela realidade (amazônica) unindo a vivência e a erudição.
A base educacional montada neste final do século XIX, legou ao Brasil
escritores como Inglês de Sousa e José Veríssimo.
Em 1853, nasce em Óbidos, Pará, http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%93bidos_(Par%C3%A1) o romancista Inglês de Sousa. Filho de família abastada, estudou as
primeiras letras em sua cidade natal, o que teria sido impossível tivesse
nascido uma década antes, e a seguir formou-se em Direito pela Universidade de
São Paulo.
Herculano Marcos Inglês de Sousa, http://pt.wikipedia.org/wiki/Ingl%C3%AAs_de_Sousa embora tenha sempre vivido longe de sua
terra devido sua atividade como juiz de direito, jamais a esqueceu e toda a sua
obra reflete uma aguda vivência e forte capacidade de observação crítica, fruto
de uma infância entre gente de cultura, que formavam um microcosmo
civilizatório nesta rica área de pecuária tradicional e fazendas de cacau.
Como o Missionário (1888), sua obra mais
famosa, o autor introduz no Brasil o naturalismo, mas com um certo mormaço, uma
certa sensualidade amazônica, sem a fria liturgia da escola europeia. Do mundo
do cacau, anates do ciclo bahiano que nos daria Jorge Amado, Inglês de Sousa
legou dois extraordinários romances: O Cacaulista (1876) e Coronel
Sangrado (1877), que prenunciam o realismo crítico de Graciliano Ramos e
José Lins do Rego.
Inglês de Sousa foi um homem influente em seu tempo
e não apenas como romancista, Fundador com Machado de Assis da Academia
Brasileira de Letras, onde ocupou a cadeira número 28, cujo patrono era Joaquim
Manuel de Almeida, exerceu o cargo de presidente das províncias de Sergipe e
Espírito Santo, fixando-se mais tarde no Rio de Janeiro, onde foi jurista
respeitado. Homem afinado com os rituais do poder, advogado sagaz e bem
sucedido, Inglês de Souza, no entanto, escreveu obras densas, despidas de regionalismo.
Uma visão nada complacente com as injustiças sociais e o abandono do homem
comum na Amazônia. Ao lado José Veríssimo, outra grande figura amazônica
daqueles tempos difíceis e tristes, Inglês de Sousa compõe a dupla de homens de
letras nascidos no grande vale.
José Veríssimo, http://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_Ver%C3%ADssimo também de Óbidos, Pará, onde
nasceu em 1857, estudou suas primeiras letras em Manaus, cursando mais tarde,
no Rio de Janeiro, a Escola Politécnica. Na opinião de seus contemporâneos e no
julgamento da posteridade, foi uma das maiores cultura de sua época, além de
escritor primoroso e crítico literário severo. Sua obra mais importante é a História
da Literatura Brasileira (1916), onde se contrapõe ao nacionalismo
positivista e cheio de parcialidade do crítico Sílvio Romero, seu rival no
campo da crítica literária. Seus Estudos de Literatura Brasileira reúnem
observações nada impressionistas sobre nossa literatura.
(*) É escritor, dramaturgo e articulista de a
Crítica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário