A tragédia transforma-se em drama e o fato em vergonha nacional, imputando aos governantes a responsabilidade pelos atos.
Ademir Ramos (*)
Embora o estado do
Amazonas concentre a maior população indígena do Brasil suas comunidades
encontram-se esquecidas e abandonadas, não merecendo dos governantes o respeito
que a história impõe e nem tampouco o cumprimento dos Direitos que a
Constituição Nacional assegura a estas nações para salvaguardar a vida, a
cultura, o território, os saberes, os modos próprios de aprendizagem assentados
na autodeterminação e afirmação das identidades étnicas e nacional. Visto que,
os territórios indígenas situam-se em áreas estratégicas de grande valia para a
segurança do Estado, como também para a soberania nacional.
A omissão do Estado pode
ser vista de forma criminosa se analisar os fatos historicamente. Os índios
assim definidos nos termos do Direito Ultramarino, secularmente, são os
“originários da terra” e por isso foram resguardados e protegidos contra a
volúpia dos colonizadores insanos, quando não, usados como bucha de canhão para
garantir as terras que a Coroa Portuguesa julgava ser de seu domínio.
O Estado Brasileiro funda
seus tentáculos contra os Direitos das nações indígenas perseguidos em seus
territórios e expropriados em seus Direitos naturais, não só como homem, mas,
sobretudo como nação. Nesse processo relacional conjugam-se forças materiais e
espirituais a acelerar o genocídios desses homens e mulheres que por serem
diferentes estavam condenados a morte cultural, social e física em nome do
Estado e da fé.
Por tudo isso, esses
povos bem deveriam ser tratados com dignidade e justiça, recebendo do Estado à
merecida atenção quanto às políticas públicas com foco na sustentabilidade de
suas comunidades agregando atenção à saúde, educação e apropriação de novas
tecnologias centradas na sociobidiversidade a requerer partilha pelos serviços
ambientais prestados a sociedade como um todo.
O abandono dos povos
indígenas tem como ação estruturante a expatriação de seus territórios. Este
ato é feito de forma política não investindo na permanência desses povos em
suas terras que, por sinal, é de propriedade da União. Assim sendo, é
compulsoriamente tangidos a cidade, vivendo em condições de extrema pobreza,
miséria moral e corrupção dos costumes.
Ser índio no Brasil e,
particularmente, no Amazonas é resistir contra os preconceitos e a toda forma
de discriminação estruturante dos governantes, que pouco ou nada fazem para
assegurar a estas comunidades tradicionais seus Direitos originários. A União,
por sua vez, empurra para o estado determinadas competências e este, muitas
vezes, repassa aos municípios tais responsabilidades, instituindo dessa feita,
uma rede de omissão e abandono que resulta no genocídio ou na folclorização
dessas culturas.
Para o governante, quase
sempre, os indígenas são lembrados quando se fala em turismo, artesanato ou
outras mercadorias que eles e seus agentes julgam que essa gente tem a
obrigação de saber ou representar para justificar o exótico como parte de uma
política de Estado. A discriminação é tão grande que alguns deles mesmo com
acesso a Universidade não tem os meios necessários para continuar seus estudos,
voltando ao ponto inicial, delegando as igrejas e as ONGs missão que é de
inteira responsabilidade do Estado, com isso fraqueza a segurança, tornando a
soberania nacional-popular refém de interesses externos.
Esta tensão está presente
por toda fronteira do Estado Nacional na Amazônia, obrigando os índios
aliançarem-se com outras forças que podem até mesmo colocar em risco o
patrimônio do povo brasileiro. Se isso se consuma, o fato que deveria ser
tratado no campo das políticas públicas passa a ser referenciado pelas forças
militares como caso de polícia, criminalizando os indígenas pela prática da
biopirataria ou do narcotráfico. A tragédia transforma-se em drama e o fato em
vergonha nacional, imputando aos governantes a responsabilidade pela omissão,
preconceito e discriminação.
(*) É professor,
antropólogo e coordenador do Jaraqui e do NCPAM/UFAM.
Nenhum comentário:
Postar um comentário